quarta-feira, 15 de novembro de 2017

ENTRELINHAS





um livro
essa mistura de música
e mistério redivivo na nervura das palavras
larvas escorrendo em miniaturas de gelos
quebrados ao viés
das papoulas sorridentes em tempos idos
de livros lidos
por uns olhos de sonolenta procura
em achados de saber do caminho que ria
tragédias
para mostrar o obsceno
das verdades caídas no chão do palco lambuzado
de vidas

via de caminhos tão opostos
um livro
às vezes tão de vidro que nos vemos nele refletidos
às vezes tão sem capa expondo nossa carne retalhada
nossa alma enfermiça
culminando em pedaços de alegrias revestidas

de sobre-humana carcaça

FOTOGRAFIAS À LUZ DA ESCURIDÃO




parei para ver o menino
que andava sem pernas sobre 
uma passarela
de espinhos que lhe davam voltas
nas costelas seu olhar desabrigado
compondo cuidados
com o mundo
atolado em guerras de salivas desconcertantes
babas ocas pingando-lhe dos ouvidos
quadrados sonhos derretidos em granadas
de açúcares mascavos
percorriam
suas entranhas de estranhas metralhadoras
a pipocar-lhe os sonhos nem nascidos
ainda lembrança vaga de um tempo
em que corpos não
voavam como pássaros estilhaçados pelo ódio
de olhares baços de ambição parei para ver
o menino sem pernas e quis emprestar-lhe
minhas mãos sem dedos e ele me ofereceu
suas pernas sem chão e eu voei
despregada
dos medos amansado o coração das feras
de tição a atordoar-me o peito parei para ver
o menino sem pernas


... e são.

CONFLUÊNCIAS




Um pedaço de sol
rolou por entre meus dedos cortados
do verde das árvores voantes pelo chão
de algodão
na aspereza de caminhos empapados de suor
molemente escorridos
pelas fendas da vida que eu supus
ser
o dia do juízo final do bom senso pendurado no peito
suspenso
entre dois pregos pegos de surpresa
ante a impossibilidade da noite
acordar
de sua letárgica alegria adversária das planícies
as mais inexistentes dentro do caos perfeito da ordem
e do progresso
de um cenário encharcado de sons
inaudíveis
amplexo abrangente da última agonia de um palhaço
errante
pelos picadeiros da ostra arrancada da pérola
vesga de paz nos lamentos risonhos
de mares envolvidos de ventos um pedaço de sol
rolou por entre meus dedos
amassados
de tempo e o que vi não tem voz
e o que ouvi não tem imagens só as margens
se abrindo para um rio que não tem águas a fonte
secando roupas de gente vestida de oceanos
tsunamis
tufões 
vulcões ingerindo ossos frutos
a sabor de carne nascidos de um pedaço de sol por entre meus dedos
adormecidos


.......e só

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

FOI BONITO




Se eu te encontrar num desses acasos
que a vida, caprichosa, faz acontecer,
não fugirei de mim.
Firme como um cedro do Líbano enraizado
em águas caudalosas,
uma vez mais, vou te olhar.

Sei que verei estrelas se acendendo em teus olhos,
a lua gotejando poemas,
o sol aquecendo o frio do corpo,
canções cifradas de diademas,
o amor − feliz − cicatrizado nas cinzas do fogo.

Naquele instante, saberei que tudo é mesmo impermanente.
Fragmentos de desejos.
Que tudo foi um estar ausente,
uma presença fugidia,
um alcançar inatingível.

Que tudo foi tão breve, mas bonito.
Porque naquela duradoura brevidade,

houve lampejos do infinito.